Casa de Jobim abriga vozes irregulares
Título: Casa da Bossa
Artista: Vários
Gravadora: Universal Music
Cotação: * *
Nos anos 90, a diretoria da gravadora PolyGram (hoje Universal Music) teve a feliz idéia de regravar sambas de várias épocas com duplas formadas especialmente para o projeto por cantores de estilos diversos. Nascia a série Casa de Samba, que rendeu quatro discos e gerou projetos similares (e não tão bem-sucedidos) como Casa da Bossa e Casa do Forró. Dez anos depois, a companhia retoma o projeto com o CD (capa à direita) e DVD Casa da Bossa - Homenagem a Tom Jobim, gravados ao vivo em Canelas (RJ), no ano passado, durante a Festa Nacional da Música.
Refinada na sua aparente simplicidade, a música de Tom Jobim costuma pôr à prova a afinação e a extensão vocal dos cantores que se aventuram a recriá-la. É quando aparecem as deficiências evidentes em Casa da Bossa. O time de 17 intérpretes recrutado pela Universal - com o produtor Otávio de Moraes - peca pela irregularidade. E nem dá para culpar os arranjos do violonista Oscar Castro Neves, reverentes à obra de Tom e tocados por virtuoses como Leandro Braga (piano), Marcelo Mariano (baixo), Carlos Bala (bateria), Teco Cardoso (sopros) e o próprio Castro Neves ao violão.
A bonita capa do CD evoca o espírito da obra de Tom. As interpretações, nem tanto. Se os veteranos dão o habitual banho de segurança (basta ouvir a leitura exuberante de Leny Andrade para Se Todos Fossem Iguais a Você), os novatos deixam a desejar. Sandy & Junior, por exemplo, se arriscam a cantar Águas de Março, mas a voz dela assume tom assustadoramente infantil quando incursiona pelo universo da MPB. Quando adolescente, Sandy era cantora afinada e graciosa. Mas sua voz não acompanhou seu crescimento (e sua salutar tentativa de navegar por outras águas) e insiste em soar... adolescente. Pena! E o que dizer de Isabella Taviani, over acima de qualquer limite razoável?? Ela consegue transformar Caminhos Cruzados num tema brega e sentimental. Cantar Jobim é mesmo para poucos. Até Pedro Mariano, bom cantor, se mostra sofrível em Só Tinha de Ser com Você.
Claro que há acertos. Fora da cena eletrônica, Fernanda Porto até consegue valorizar Modinha em registro vocal contido. Paula Lima explora acertadamente o suingue de Só Danço Samba. Já Orlando Morais comprova sua afinação e sensibilidade em Por Causa de Você. E Roberta Sá confirma sua intimidade com o mundo do samba em Brigas Nunca Mais, ainda que sem reeditar o frescor vocal exibido em seu disco Braseiro.
A surpresa - não necessariamente boa - é Negra Li. A rapper paulista sai do universo do hip hop e da música negra para cantar Garota de Ipanema em interpretação melódica. Ate que Li nem faz feio, mas sua deslocada escalação deixa entrever o caráter mercantilista de tributos do gênero. Claro que a Universal aproveita para promover estrelas ascendentes de seu elenco - o que explica a presença de Marjorie Estiano, requisitada para reviver Wave numa onda que não é a sua.
A boa surpresa é Thedy Corrêa, o vocalista do grupo gaúcho Nenhum de Nós. Ele - que se apresenta apenas como Thedy no projeto - consegue evocar o estilo de Tom Jobim em Corcovado. Já Jorge Vercilo e Luciana Mello não chegam a tirar a beleza de Dindi e Luiza, respectivamente. Soam corretos.
Enfim, quem gosta de tributos do gênero que entre na Casa da Bossa e se divirta! Mas fique avisado de que nem todos são iguais a Antonio Carlos Jobim. Quase ninguém, aliás.