Ana Carolina se assume em entrevista
A revelação não é exatamente bombástica para o público majoritariamente feminino que vem lotando os shows de Ana Carolina nos últimos anos com explícitas manifestações de carinho pela artista. Até para a platéia menos antenada, a cantora já havia sinalizado suas preferências sexuais com a inclusão no roteiro de seu anterior show Estampado de Eu Gosto de Mulher - sucesso machista do grupo Ultraje a Rigor que, na voz de Ana, se converteu em orgulhoso manifesto do amor lésbico - e, posteriormente, da inédita Eu Gosto de Homens e Mulheres, composta pela artista para seu quarto disco solo.
De qualquer forma, a atitude da cantora é corajosa, pois sua declaração foi feita para a revista de maior circulação nacional - lida por gente de várias idades, idéias, classes e (pré-)conceitos. Ao se assumir, Ana acaba com hipocrisia reinante no meio artístico quando, em entrevistas, muitas cantoras procuram forjar heterossexualidade evidentemente falsa. Honrosa exceção foi a saudosa e honestíssima Cássia Eller que, além de nunca ter se insinuado como heterossexual, foi aos poucos assumindo publicamente sua condição de lésbica, inclusive escancarando para o público seu relacionamento com Maria Eugênia.
Parece simples, mas não é. O preconceito também ronda a indústria fonográfica. Conhecida sambista ficou cinco anos sem gravar porque se assumiu lésbica em entrevista ao jornal gay O Lampião. A própria Cássia Eller se assumiu contra a vontade de seu empresário na época, Rafael Borges, e teve que adotar imagem mais feminina sugerida pela gravadora Universal Music para embalar a capa e o encarte do disco Com Você... Meu Mundo Ficaria Completo (1999).
A declaração de Ana Carolina é especialmente corajosa porque foi dada no momento áureo de sua carreira. A cantora nunca vendeu tanto disco. Somente sua coletânea na série Perfil, da Som Livre, ultrapassou as 500 mil cópias. Seu recém-lançado CD Ana & Jorge, gravado com Seu Jorge, já foi para as lojas no início do mês com expressiva tiragem inicial de 125 mil cópias. Isso sem falar nos DVDs, que já somam três na videografia de Ana. Resta torcer para que a mentalidade do brasileiro esteja realmente evoluindo nesta sempre delicada questão da sexualidade e que Ana Carolina não perca um consumidor sequer de seus discos pelo fato de ter sido honesta e verdadeira com seu público.