Um papo particular com Marisa Monte
A dupla gestação aconteceu a partir do nascimento, em dezembro de 2002, do primeiro filho de Marisa, Mano Wladimir, fruto da união da cantora com o músico Pedro Bernardes. A maternidade lhe permitiu dar um tempo na carreira, iniciada na segunda metade dos anos 80, para ficar em casa e ser mãe em tempo (quase) integral durante 2003 e 2004.
"A serenidade dos discos tem a ver com a maternidade. Meu filho me deu tempo e justificativa para ter tempo. Comecei a trabalhar cedo e me dei o direito de ficar em casa. Curti a maternidade até às últimas conseqüências. Amamentei até um ano e meio", conta a cantora.
Entre uma mamada e outra, Marisa teve a idéia de inventariar a produção de sambas da velha guarda através de entrevistas realizadas pela artista em sua casa, na Gávea, com bambas como Ratinho, Surica, Elton Medeiros, Paulinho da Viola e Monarco. "Ouvi o material e digeri aquele repertório. Meu foco não era somente a busca por material inédito, mas pesquisar a formação de Dona Ivone Lara, de Monarco... A convivência mais intensa com esse universo do samba me inspirou para que eu fizesse com Arnaldo (Antunes) e (Carlinhos) Brown alguns sambas", explica Marisa.
Samba que puxa o disco Universo ao meu Redor nas rádios, O Bonde do Dom, por exemplo, foi composto pelo trio tribalista na viagem feita à Europa em 2003 para promover o disco do grupo com shows e entrevistas. Já da pesquisa com os bambas, Marisa colheu Pétalas Esquecidas, inusitada valsa de Dona Ivone Lara, feita em 1945, quando a compositora trabalhava como enfermeira na colônia Juliano Moreira (sua colega de plantões, Teresa Batista, é parceira na música). "Fiquei apaixonada por ser uma música de duas mulheres. O universo do samba tem ótica masculina. E estes meus dois discos são muito femininos, delicados. O discurso e o olhar são femininos", conceitua Marisa.
Paralelamente à garimpagem de sambas, Marisa Monte começou a digitalizar seu acervo particular de fitas cassetes com sua produção autoral. Nascia o embrião de Infinito Particular. "Tinha gravado com os Tribalistas um trabalho autoral, coletivo. Fiquei com vontade de fazer mais um disco focado nas minhas composições. A partir do Mais, as vertentes de compositora e de intérprete de sambas foram compartilhadas em meus discos. Achei que podia separá-las e fiz dois discos complementares", contextualiza.
Nome já envolvido na produção do CD dos Tribalistas, Alê Siqueira foi convocado para pilotar com a cantora o disco autoral. "Ele é um maestro de acabamento impecável", elogia. Já a admiração por Mario Caldato, que conheceu em Nova York em 1998, levou Marisa a convidar o brasileiro que se radicara nos EUA para produzir o álbum de sambas. "Não queria fazer um disco de samba tradicional. Queria gravar um CD que tivesse a ver com a minha sonoridade, com o som dos meus outros discos. Não podia pensar num disco meu como se fosse um do Argemiro (Patrocínio, saudoso bamba da Portela que teve seu único disco solo editado em 2002 por iniciativa de Marisa)", ressalta.
De outros encontros, vieram os convidados do disco. Fernandinho Beat Box, craque ao tirar da boca sons que simulam efeitos eletrônicos, entrou nos discos quando Marisa o conheceu num show na praia dividido pela cantora com nomes como Marcelo D2, que trabalha com Beat Box. Já a participação de David Byrne nasceu da vinda do artista americano para a edição 2005 do VMB (Video Music Brasil), a premiação de clipes da MTV que teve Marisa como uma das apresentadoras. "O encontro com Byrne me reacendeu a vontade de fazer algo com ele", lembra Marisa, que virou parceira do compositor em Statue of Liberty, faixa do disco do samba que traz Byrne nos vocais.
O leque de parceiros se abriu também com a chegada de Seu Jorge, Marcelo Yuka e Adriana Calcanhotto, artista atualmente empresariada por Leonardo Netto, que também cuida das turnês de Marisa. "Isso nos aproximou, mas sempre admirei muito a Adriana. Ela é caprichosa, dedicada. Todo mundo que tem filho ouviu muito o disco Adriana Partimpim. Ela me trouxe uma música pronta e eu dei para ela várias melodias", conta Marisa. E assim nasceu Pelo Tempo que Durar, a primeira parceria das duas compositoras.
E assim nasceram Universo ao meu Redor e Infinito Particular. Os dois novos rebentos de Marisa Monte.