Coletânea dupla do MPB-4 tem (falsas) jóias raras, mas prima pelo capricho
Resenha de disco
Título: Quarenta Anos Contra a Corrente
Artista: MPB-4
Gravadora: Universal Music
Cotação: * *
Em 2002, a gravadora Universal repôs parte de seu acervo em catálogo na série Tudo, que, a cada fornada, reeditava todos os álbuns originais gravados na companhia por um determinado artista. Saíram coleções de Zizi Possi, Ângela RoRo e Ivan Lins, entre outros. Infelizmente, a série não teve continuidade e deu lugar às coletâneas como esta do MPB-4. Apesar do capricho da edição, a compilação Quarenta Anos Contra a Corrente vai na contramão dos interesses de consumidores mais exigentes.
Primeiro, porque os 40 anos do título já são 43 (se levado em conta o ano da fundação do grupo, 1962) ou, no mínimo, 41 (se o ponto de partida for a data da gravação do primeiro compacto, gravado em 1964 sem qualquer repercussão). Segundo, porque as 40 faixas abrangem apenas 19 anos, cobrindo o período 1966-1985 - a rigor, o mais expressivo do MPB-4. Terceiro, porque o conceito do álbum duplo - o de reunir sucessos no CD 1 e raridades no CD 2 - omite alguns hits indispensáveis (sobretudo Olê Olá) no primeiro disco e não se sustenta no segundo.
Sim, há muitas faixas raras no disco 2 - casos do samba-enredo Iaiá do Cais Dourado (lançado por Martinho da Vila em 1969 e regravado em 1971 pelo grupo para um disco do Salgueiro) e de Você Abusou e Menina da Ladeira, fonogramas extraídos de compacto de 1971. Vale destacar também a gravação esfuziante do samba A Alegria Continua (Mauro Duarte e Noca da Portela), feita o pelo quarteto para compacto de 1973. O problema é que muitas "raridades" são apenas faixas de discos de carreira do grupo, alguns inéditos em CD e outros até já editados no formato digital, caso de Bons Tempos, Hein?! (1979), álbum do qual foram selecionadas as "raridades" Amigo da Onça e Cebola Cortada.
De qualquer forma, é um deleite poder ouvir a perfeita harmonia vocal do MPB-4 em temas como Ana Luiza (Tom Jobim), em registro de 1975. É instante sublime e mais romântico de um repertório marcado pela firme postura política de lutar contra a opressão da ditadura da época - posição explicada no farto encarte, que detalha a origem de cada faixa e reconstitui a trajetória do quarteto em texto biográfico. A edição é de fato caprichada - apesar do discutível critério do que é raro. Mas o ideal seria reeditar todos os álbuns do grupo. Isso, sim, seria nadar contra a corrente de um mercado fonográfico apático e sem ousadia.